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Christian Cravo: Paisagens Antrópicas

sáb., 19 de out.

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São Paulo

Christian Cravo: Paisagens Antrópicas
Christian Cravo: Paisagens Antrópicas

Horário e local

19 de out. de 2024, 11:00 – 21 de dez. de 2024, 18:00

São Paulo, Alameda Lorena, 1257 - casa 1 - Jardins, São Paulo - SP, 01424-001, Brazil

Sobre o evento

Antropia é um termo que se refere ao estudo da ação das pessoas sobre o meio ambiente, analisando como nossas intervenções impactam a natureza e os ecossistemas. Derivado do grego, onde "anthropos" significa "ser humano" e "-ia" indica uma condição ou estado, o conceito destaca a influência das atividades humanas no ambiente.

Este trabalho documenta paisagens de espaços residuais e explora como lidamos com o descarte e a reciclagem de materiais, como vestuário da indústria fast fashion, um lixão eletrônico em Accra, capital de Gana, milhões de pneus alocados nos desertos do Oriente Médio, enormes navios de carga nas praias de Chitagong, Bangladesh.

Esses locais, muitas vezes considerados periféricos e abandonados, são espaços em constante transformação, que desafiam as definições clássicas e nos convidam a repensar a relação entre o humano e o não-humano. A ideia de "processos movediços" sugere que esses ambientes estão em um estado de fluxo contínuo, onde os resíduos e os vestígios da atividade humana se entrelaçam com a natureza, criando uma nova narrativa sobre a coexistência e a interdependência.

As decisões que tomamos hoje deixarão uma herança duradoura sobre a gestão de nossos recursos naturais e o delicado equilíbrio ecológico. A degradação da natureza não deve ser vista apenas como um problema a ser resolvido, mas como um ponto de partida para reifigurar a relação entre as pessoas e o meio ambiente. Nesse contexto, a reapropriação dos espaços residuais pode abrir caminho para práticas mais sustentáveis e uma nova consciência ecológica. A proposta é entender a natureza como uma categoria política, reconhecendo que a intervenção humana acelera, altera ou detém processos naturais.

Aqui, o conceito de Antropoceno se torna central para a discussão. O Antropoceno é uma era geológica que evidencia a significativa influência humana sobre o planeta, destacando como nossas atividades moldam não apenas o meio ambiente, mas também as condições climáticas, a biodiversidade e os ciclos naturais. Este conceito está intrinsecamente ligado ao que chamamos de "antrópico", referindo-se ao impacto humano no mundo natural. A relação entre o Antropoceno e o antrópico é evidente nas paisagens que documentamos: Cada resíduo, cada espaço residual, é um testemunho da nossa presença e das nossas ações.

Nesse sentido, a ideia de "terra em transe" também se conecta aos processos movediços que caracterizam este registro artístico. Esses processos refletem a dinâmica e a transitoriedade das paisagens antrópicas, onde o que consideramos "desperdício" pode ser reinterpretado como um recurso, e os espaços considerados "abandonados" podem se tornar locais de inovação e resistência. O próprio ato de documentar essas paisagens é um processo artístico que busca capturar a fluidez da relação entre o humano e o não-humano, revelando a interdependência que define nosso tempo no Antropoceno.

Bateson (2000), em seus estudos sobre ecologia e cibernética, destaca que a Revolução Industrial, apesar das mudanças significativas que trouxe à sociedade, impediu que as pessoas percebessem que a exploração do meio ambiente resulta, na verdade, em sua própria autodestruição (BATESON, G. Steps to an Ecology of Mind. 2000).

Diante disso, este projeto se mostra relevante e oportuno, pois aborda a complexa interação entre desenvolvimento econômico, meio ambiente e sustentabilidade. Os espaços residuais refletem as relações que estabelecemos com o que consideramos descartável. Discutir resíduos implica também falar sobre perda, um conceito relacionado ao ciclo natural de nascimento, florescimento e morte, uma ideia frequentemente evitada em muitas sociedades. A degradação, sob a ótica ocidental, é associada à impureza e à contaminação, o que gera uma necessidade de combate para manter a limpeza e a perenidade. Nesse cenário, países desenvolvidos pagam a países em desenvolvimento para receber lixo tóxico, um processo que funciona como os sacos não translúcidos citados por O'Donnell, fazendo o lixo desaparecer da vista e dos limites do país, além de ser uma solução mais barata do que os tratamentos necessários para neutralizar seus efeitos (O'DONNELL, J. Waste Colonialism: The Global Trade in Toxic Waste. 2011). Assim, países do Norte Global enviam resíduos tóxicos para os países do Sul Global, configurando o que se pode chamar de colonialismo de resíduos. Isso gera um paradoxo: de um lado, existe a lógica do desenvolvimento, do progresso, do controle, da ordem e do monitoramento; enquanto, em termos biológicos e semióticos, há uma necessidade constante de proliferação, intercâmbio e transformação.

Destacar histórias de comunidades que se adaptam à degradação ambiental e aos desafios sociais revela exemplos de resiliência. Essas narrativas são essenciais para entender como a degradação pode ser enfrentada e transformada em oportunidades de inovação e resistência. Portanto, este projeto não apenas destaca questões ambientais urgentes, mas também enfatiza a necessidade de uma abordagem equilibrada que considere tanto a integridade ecológica quanto a equidade social. Ao dar voz às ações do Sul Global, buscamos inspirar uma compreensão mais profunda da interconectividade e promover uma responsabilidade coletiva em relação ao desenvolvimento sustentável.

A conexão entre degradação ambiental e paisagens antrópicas é clara: a maneira como lidamos com nossos resíduos e como as comunidades respondem a isso moldam nosso futuro. A degradação não deve ser encarada apenas como um problema a ser combatido, mas como uma oportunidade para reimaginar nossas relações com o meio ambiente. Ao reconhecer os resíduos como recursos e os espaços residuais como locais de potencialidade, podemos transformar a narrativa da perda em uma história de resiliência e inovação. Essa mudança de perspectiva é fundamental para construir um futuro mais sustentável e justo, onde a degradação não é o fim, mas o início de novas formas de vida e convivência. A "terra em transe" nos ensina que, mesmo em meio ao caos, há possibilidades de regeneração e criação, onde a arte e a natureza se entrelaçam para formar novos significados e novas esperanças. No contexto do Antropoceno, essa interdependência se torna ainda mais evidente, exigindo uma reavaliação de nossas práticas e valores, para que possamos habitar o planeta de maneira mais harmoniosa e responsável.

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